Domingo, 22 de Agosto de 2010

Millennium Mambo/ Qiānxī Mànbō (2001) Hou Hsiao-Hsien

Um techno suavemente melancólico acompanha Vicky (Qi Shu) enquanto esta percorre um túnel banhado de uma luz azul. A jovem caminha em câmara lenta e uma vez por outra ela olha para trás, olha para o seu passado sem deixar de caminhar, leve decidida e aliviada neste túnel que é a sua vida. Ouvimos em voz off a jovem e ficamos a saber que aquele momento de epifania fora vivido 10 anos atrás, em 2001, após o fim de uma relação conturbada. Esta breve introdução do filme cria a fugaz sensação de leveza, sensação essa que dita a maneira de encarar a vida de cada uma das personagens; sobretudo da protagonista, que em dez anos simplesmente coleccionou fragmentos suspensos do tempo, sem ambição sem direcção.

O cinema de Hou Hsia-Hsien é um cinema inteiramente intuitivo sem se desligar da interpretação crítica de cada espectador. Hou aproxima-se da sua matéria de análise quase que de uma maneira fenomenológica: amorosa e desinteressadamente sonda-a, sente a sua pulsação, sem a recomendar ou condenar. Desta forma de encarar o objecto nasce tanto um naturalismo tosco como um artificialismo rebarbativo - a realidade é sentida de uma forma intensa e humana. 

Grande parte de Millennium Mambo é passado dentro de clubes nocturnos, onde seguimos os passos de Vicky, dividida entre o agressivo e neurótico DJ Hao-Hao (Chun-Hao Tuan) e o taciturno paternalista Jack (Jack Kao). Estes conflitos emocionais não se tratam de um triângulo amoroso emerge em conflitos, mas sim de uma história deliberadamente pobre em peripécias, porém rica em humanidade; a quase inexistência de "ficção" permite que a realidade aflore.

Nós temos de nos deixar embarcar neste filme para o podermos sentir; não existe qualquer delineamento psicológico da protagonista ou qualquer princípio moral nítido, a análise psicológica do espectador provem só depois de uma bela viagem sensorial. Quanto maior é a naturalidade com que Hou renuncia às subtilezas psicológicas, mais o filme se assemelha a sua própria experiência; a profundidade é substituída pela intensidade.

O peculiar realismo deste autor enche-nos de uma tremenda sensação de conforto mas ao mesmo tempo distancia-nos da acção, tornando-nos emsimples mirones alheios - não que condene este afastamento antes pelo contrário.

Millennium Mambo é sem dúvida uma obra memorável.

publicado por Diogo às 17:07
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1 comentário:
De Dora a 24 de Agosto de 2010 às 15:04
Diogo, posso pedir-te para fazeres o comentáriod e novo no post do filme?

http://omeumaiorvicio.blogspot.com/2008/09/214-lilja-4-ever-2002_05.html

Ando a mudar umas cenas no blog. Peça desculpa...

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