Nesta sua terceira longa metragem, Larry Clark continua com o seu estudo característico que incide na putrefação dos ideais da juventude dos dias de hoje. O guião baseado na obra de Jim Schultze, relata um assassinato verídico ocorrido em 1993, no qual um rapaz abusador (género bully) é morto pelos seus amigos inconformados e revoltados com as suas maneiras de proceder.
Desta vez a pressão em torno do projecto era muito maior; quando o irreverente Kids surgiu, surgiu como um "outsider", uma ácida obra inovadora; enquanto que em Bully para além de se revelar a verdadeira oportunidade de afirmação de Clark, suporta também o culto do que o antecede e um teor muito delicado já que é extraído de factos reais (a obra acabou mesmo por não concorrer a nenhum festival).
A acção decorre na Florida e a história concentra-se na relação de dois "amigos": Marty, um tímido e inseguro surfista (Brad Renfro) que é constantemente espezinhado e humilhado por Bobby (Nick Stahl) um snobe e autoritário novo rico. Num impulso inconsciente, Lisa (Rachel Miner) sugere o homicídio do bully, esta ideia é recebida de braços abertos por amigos seus, alguns deles nem nunca viram o dito rapaz na vida e obviamente que não têm nada contra ele.
Apesar de uma certa intenção contestativa, Bully falha da mesma forma que as obras do autor anteriormente o fizeram: o insaciado voyeurismo não permite que o filme expluda deixando-o a pairar, por conseguinte o filme revela-se despreocupado de mais para ser considerado uma obra de ficção ou falso de mais para ser visto como documental. Mais uma vez a narrativa de Larry Clark joga com o aparente improvisado melodrama e o olhar "mirone" quase fotográfico dos seus intérpretes.
A moralidade não é amiga deste autor e eu não o afirmo num tão de desdém, ele podia perfeitamente jogar com os seus princípios e criar algo, mas não é isso que acontece, toda a "criação" de Clark baseia-se num voyeurismo desejado/moldado e nem sempre humano ou real, se não como se explica os jovens adolescente passarem o dia nus ou drogados? Fico em dúvida se isto se trata de um estudo sobre a juventude ou de puro fascínio pela marginalidade.
Mas como eu tento sempre ver todas as funções de cada ferramenta, apercebi-me também que apesar de o condenar, esta abordagem "obcecada" em parte eleva o filme para o verdadeiro espectáculo que é a mente de um jovem troglodita, isto não são meros delinquentes...são fantasmas em ácidos o que dá um certo charme ao filme (mesmo assim não o salvando, interessante digamos). Apesar de nesta obra o flagelo ter outro tom revigorante, o autor perde a oportunidade de ir além do documentário chocante que foi Kids e envergar por um drama objectivo sem perder os sais irreverentes, mas o voyeurismo é um vício!
É mais que óbvio que um dos pontos reconhecidos em Larry Clark é a sua crueza, o problema é que sendo assim os seus objectos de estudo não podem ser limados nem espremidos e a verdade intuitiva confunde-se com puro choque daí a minha principal empatia para com este autor ser o seu verdadeiro propósito e até aonde vai a sua sinceridade para com o cinema.
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